domingo, 28 de setembro de 2014

a gente continua

Quando você me pediu em namoro da forma mais estranha possível. Quando me olhava com cara de sapeca até eu ficar vermelha. Quando me ligava e eu amava o teu sotaque. Quando, deitado no meu colo, contava teus cílios e permitia que nossos corações ensaiassem juntos um samba. Quando, nas tardes de domingo, tomávamos nossa cerveja assistindo futebol e eu reclamava e você ria. Quando pensamos em viver juntos um mês, um ano, uma vida. Quando sabia exatamente onde queria parar. Quando acordava cedo só para te observar dormindo. Teu sono era tão pesado e gostoso. Quando você me puxava para mais perto de você durante inúmeras noites. Quando pensamos na nossa casa, no nossos cachorros, nos discos que teríamos. Quando eu tinha para quem ligar quando o mundo estivesse desabando. Quando eu ficava quieta só para te ouvir falar para caralho e rir de uma maneira gostosa. Quando os dias eram bons e a felicidade imensa. Quando pensei saber exatamente o que era o amor. Quando você segurou minha mão pela primeira vez e eu senti todo o meu corpo quente e acolhido. Quando roubou meu coração com recortes de poemas perdidos. Quando despejávamos sorrisos por onde passávamos e eu pensava que a vida teve que ser vivida até ali, só para eu cruzar contigo na esquina. Quando você fazia cócegas até eu odiar ter te chamado para vim. Quando eu te ligava por tudo e passávamos horas pensando no mundo. Quando, entre sorrisos, falava sobre nós dois e tudo virava música. Quando era impossível esconder o quão mais feliz eu estava. Quando meu sorriso era mais largo e, de longe, perguntavam o motivo dessa tanta felicidade e eu dizia que tudo era responsabilidade de um moço qualquer. Quando nos despedíamos entre abraços em rodoviárias. Quando eu achava que éramos o casal mais acertado de todo o mundo. Quando pensei que ficaríamos juntos até o fim e que você era a pessoa exata. Quando eu guardava o som de suas músicas no computador, só para ouvir no meio de uma semana pesada. E quando esse som me fazia tão bem. Quando você era a última pessoa com quem eu falava e a primeira, também. Quando você era engraçado e eu cabeça dura. Quando eu te contava cada detalezinho do meu dia. Quando você me abraçava no meio de um dia qualquer. Quando todas as músicas me lembravam você. Quando eu pensava ser o que você procurava, assim como você sempre foi o que eu procurei. Quando eu dormia com sua voz rouca falando sobre as coisas. Quando você reclamava das matérias do jornal enquanto eu passava o café. Quando fumávamos juntos nosso cigarro de cravo. Quando você insistia em falar teu francês errado enquanto eu escolhia mais um filme branco e preto. Quando você me ajudava. Quando teus braços foram o que me salvaram da queda. Quando você apareceu no momento exato da minha vida e fez um quadro sépia ser o mais colorido possível. Quando cantávamos juntos Os mutantes. Quando aprendeu a gostar de tropicália por mim. Quando eu reclamava da sua blusa polo amassada e quando eu a sujava com batom vermelho, só para te provocar. Quando não precisávamos dizer. Quando eu te entreguei o que de mais bonito guardava em mim. Quando trocávamos color e colos. Quando tudo deu um nó.

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

não há beleza na loucura

Não, não há beleza alguma na loucura
tudo sempre termina do mesmo modo:

sem qualquer outra nota
para montar uma melodia
qualquer
              que dance
feito bailarina
nua                              na folha
de um branco virginal
tudo termina
                 o espetáculo terrível do fim
momento de drama
pra
             pausa seguinte
ataraxia
ninguém aguenta
sinto muito, só sinto isso
                                         essa natureza inconstante do ser
não sei o que sinto
um segundo atrás, eu sabia
              me lanço
no obscuro espetáculo da vida
                                    talvez, só queria teu carinho
a luz do espetáculo
         a próxima atuação
mas
ninguém aguenta
não há beleza na loucura
                  só versos sem rima
incapacidade de se relacionar
            pro fun da mente
incapacidade
                                   de dar a mão
perdi minha
 alma
          na última esquina