quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Manifesto do só.

Gosto de estar assim: só. Totalmente só. Sem ninguém dividindo espaço na minha cama. Sem ouvir as frases clichês que nem me tocam mais, após mais uma noite. Sem me sentir tão vazia, depois de dever estar tão cheia. Só. Apenas eu e meu cigarro, numa noite em que os ventos insistem em se chocar na minha janela. Fazem um barulho que não me assusta mais, como já me assustaram, os reconheço e passo a ressoar na mesma intensidade. Quando estive na merda, naquele fundo do poço inimaginável, a solidão foi a única que poupou-me a sanidade. Nenhuma das companhias de uma noite se importaram, não havia sequer um número para discar. No fundo, todos os dias estou só. O que muda nessa noite, de um frio incrível e que me parece atemporal, é que, pela primeira vez, assumo-me sem medo. Tenho o êxtase da primeira descoberta.  Ainda não sei o que espero, muito menos o que quero ou irei fazer com essa informação. Contento-me em sentir essa sensação em sua parte orgânica. Convido-me a conhece-la de forma mais profunda. Quando chegar a essência da solidão, o que eu irei encontrar? Nesta noite não tenho medo dela.  Quando deixei de a temer, por certo aproximei-me, em anos, de dar um passo a mais rumo a autodescoberta que me lanço. Sem a temer, posso, enfim, deixar de aceitar migalhas de carinho. Cultivo, nesta noite, a esperança de voltar a caminhar e sair dessa inércia que, há tempos, me encontro. No climax do espetáculo da vida, encontro-me, contando a ela mesmo, os fatos mais importantes da minha breve existência. A solidão, meu amigo, a convidada inconveniente, mostra-se uma boa ouvinte aos meus projetos. Quero, ela sabe, terminar meu manifesto surrealista. Assistir Godard. Rever Persona. Sou, nesta madrugada, a expressão pura de Persona. Prefiro calar-me à vestir papéis. Sinto muito, ainda não estou preparada para aceitar mais alguém em minha caminhada.















quinta-feira, 7 de agosto de 2014

autobiografia em Ginsberg.

os ídolos da minha geração morreram pobres
abandonados
drogados e jogados em becos escuros
perderam a alma,  perco a minha
não a tive nessa noite
me transformo na fumaça do meu cigarro de cravo
trago, prendo, solto
solto-me por aí, sem destino
sem amor
me perdoe, ainda não acredito no amor - fardo dos mais cruéis
sonhos irreais de apaixonados
a perversa invenção da mente humana
apática
não sinto nada, sou sombra
em boeiros
em becos
a eterna sombra que observa a vida
sofre sente sofre chora grita como uma criança recém parida
do momento imperativo faço o nascimento
do outro lado do muro
serei sempre a que não cruzou o muro
a que gritou sem grito, que sentiu sem viver
a não compreendida
a puta louca infeliz modernista suburbana
a que nunca teve lar
a fumaça de cigarros alheios.