segunda-feira, 23 de novembro de 2015

parto-me

Hoje, tudo me toca. O absurdo do silêncio. O abismo que se anuncia em minha janela, toda a manhã. A sirene do nascer do dia. O (ir)remediável espanto do parto - os olhos que, sem jeito, tentam, novamente, se adaptar a luz que me invade. Lembrete, em batom vermelho, do meu corpo orgânico. O ar preenche todas as minhas lacunas -milhões de molécula que em sua vibração me fazem sólida. Disseram-me que o primeiro choro de todo o bebê é choro de dor, de espanto, de medo - o ar entrando em álveolos virgens. Não há ninguém ensinando, a cada manhã me jogam a bicicleta da vida, -Ande-a, gritam comigo! Minhas pernas, trêmulas e desajeitadas, não racionaliza o ato. Anda-se e vive-se. É tudo que há. Há e ainda sem escolha. Existe-se e ponto. Nem sequer há uma só voz humana. O universo é uma senhora muda e ranzinza gozando com minha inabilidade de ser.

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